sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Os elefantes não esquecem jamais

Juarez trabalhava numa repartição pública. Carimbava papel.

Era um sujeito metódico. Fazia tudo sempre igual, todos os dias. E era meio desconfiado.

Ao seu lado trabalhava o Palhares, que também carimbava papel. O Palhares era um tipo estranho, calado.

Trabalhavam juntos, lado a lado, há quinze anos, de segunda a sexta-feira. Mas o relacionamento entre eles era frio. Um nada sabia da vida do outro.

Os diálogos eram banais. Vagos.

- Bom-dia (ou boa-tarde).
- E aí, beleza?
- Tranquilo.
- Que calor, hein? (ou "que frio, hein?)
- Tá horrível.
- E o Flamengo? Que timeco!
- É, um fiasco.
- Aceita um café?
- Não, obrigado.
- Aceita uma água?
- Sim, obrigado.
- Bom final de semana.
- Igualmente.

E fora assim, durante exatos quinze anos.

Um dia, o Palhares falou a seguinte frase: "Os elefantes não esquecem jamais."

O carimbo na mão do Juarez parou no ar e não completou seu objetivo. Seu corpo começou a tremer. Suas axilas começaram a suar. Por que ele falou aquela frase? Elefantes, esquecem e jamais são palavras que nunca foram ditas naqueles quinze anos de trabalho.

Era como se houvesse um código de conduta entre eles, onde algumas palavras eram permitidas e outras proibidas.

E o Palhares havia acabado de quebrar este código. Mais: foram três palavras do tipo "proibidas" na mesma frase. De uma só vez.

Juarez ficou inconsolável. Por que o Palhares falou aquilo? E que diabos o Palhares queria dizer com aquilo? Será que ele, Juarez, esqueceu alguma coisa? E se esqueceu, o Palhares estava querendo dizer que um elefante é melhor do que ele? Ser comparado a um elefante? Não, isso era demais.

Juarez se levantou e deu uma carimbada com força na mesa do Palhares, que tomou um susto e o olhou por cima dos óculos sem entender nada.

Com a axilas suadas e os olhos esbugalhados de ódio, Juarez disparou:

- Elefante é a senhora sua mãe!

Juarez saiu da sala batendo a porta. Foi até sua chefia e solicitou sua transferência imediata para outro setor. Alegou que a sua relação com seu colega de trabalho estava saturada. Que o Palhares estava ficando gagá. E sugeriu que o encaminhassem para um psicoterapeuta.

Depois disso, Juarez nunca mais soube do Palhares.

Mas assim como um elefante, jamais o esqueceu.

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